O aprofundamento da mística espiritual é proposto através do recurso à figura de patronos e dos modelos de vida, que complementam e estão intimamente ligados à simbologia. O patrono é, pelo seu próprio exemplo de vida, o intercessor escolhido para uma secção. Na animação espiritual no Escutismo os elementos não surgem isolados e desligados das outras dimensões pedagógicas, pelo que a escolha dos patronos e dos modelos de vida de cada secção está diretamente relacionada com a mística e imaginário respetivos.
São Tiago Maior, também conhecido por São Tiago de Compostela (martirizado em 44 da nossa Era), foi um dos doze apóstolos de Jesus Cristo. E chama-se São Tiago Maior para o diferenciar de outros santos de nome Tiago, como o apóstolo São Tiago Menor.
Segunda a tradição, em Santiago de Compostela encontra-se o túmulo de São Tiago Maior, filho de Zebedeu.
“Santiago” é a expressão atual em língua castelhana (Espanha). Antigamente dizia-se: “San’ Iago”, “San Jacob” ou “Sanctus Iacobus”.
“Iago” é a derivação do nome grego com o qual o nomeavam no Novo Testamento: “Iacobos”. Por sua vez, este nome grego deriva do hebraico “Iacob”, como o patriarca Jacob.
Em inglês diz-se St. James.
São Tiago, o Maior, era filho de Zebedeu (Mc 1, 19) e de Salomé (Mt 27, 56) e tinha como irmãos João, também apóstolo (Mc 1, 19-20; 3, 17).
Não há registos sobre Zebedeu para além da sua mencionada paternidade. De sua mãe Salomé, sabemos que era uma das mulheres que seguiu Jesus desde a Galileia e que se encontrava ao pé da Cruz (Mc 15, 40). Era, possivelmente, irmã de Maria, mãe de Jesus.
São Tiago e a sua família eram originários de Yafia, transladados para Betsaida e habitavam nas cercanias de Cafarnaúm. Possuíam uma empresa familiar dedicada ao negócio da pesca nas margens do lago de Generaset. A esta empresa familiar estavam associados outros dois irmãos: Pedro e André (Lc 5, 3-11). Ocasionalmente contavam com a ajuda de empregados (Mc 1, 20).
Deste pequeno círculo de pescadores, Jesus levou os seus quatro primeiros discípulos, Pedro e o seu irmão André, Tiago e seu irmão João.
Estes dois pares de irmãos, sócios e amigos, seguiram o chamamento de Jesus “de imediato” (Mc 1, 16- 20). Quando empenhados no seu trabalho “sentiram o chamamento de Jesus” (Mt 4, 21), abandonaram o negócio familiar (em frente do qual continuará Zebedeu e os jornaleiros) e empreenderam a “aventura do mestre da Galileia”.
Acompanharam Jesus durante os três anos da sua vida pública.
De entre todos os discípulos que o seguiram, Jesus instituiu um grupo de doze: era uma ação simbólica e profética; era o anúncio e a realização básica do novo Israel, representando a antiga estrutura das doze tribos (Mt 19, 28).
A tradição conservou quatro listas com o nome de doze apóstolos: Mt 10, 2-4; Mt 3, 16-19; Lc 6, 13-16; Actos 1, 13. O apóstolo Pedro preside a todas estas listas. São Tiago, o Maior, ocupa o segundo lugar depois de Pedro em Marcos e o terceiro lugar nas restantes listas. Isto indica o papel relevante do apóstolo no grupo dos doze. Mas para além de ser uma peça chave no grupo dos Apóstolos, São Tiago pertencia a um grupo mais reduzido: o grupo dos íntimos de Jesus.
Jesus teve uma relação muito especial com Pedro, Tiago e João. Eram o seu grupo de confiança. Frequentemente Jesus toma este grupo e leva-os “à parte” em momentos chave, em que eles seriam testemunhas excepcionais e exclusivas tais como.
- A ressurreição da filha de Jairo;
- A transfiguração do Tabor;
- A agonia no horto de Getsémani.
Em outras ocasiões, a este trio de confiança juntava-se André (irmão de Pedro). Encontramos estes dois pares de irmãos em vários episódios:
- São os primeiros a serem chamados;
- Acompanham Jesus na jornada de Cafarnaúm, a casa de Pedro;
- Interessam-se especialmente pelos projetos de Jesus, e, concreto, pela ruína de Jerusalém (Mc 13, 3-4).
S. Tiago é uma pessoa apaixonada, capaz de por tudo em jogo; como uma pessoa que é capaz de arrastar os demais e que não pára para medir consequências.
Este carácter especial, ademais de ser uma característica pessoal, deve ser realçado sobre o fundo comum das expectativas messiânicas daquele grupo da galileia. São Tiago e o seu irmão João, assim como outros membros do grupo de Jesus, entendiam, no principio, o caminho de Jesus até Jerusalém como o momento propício para instaurar o tão ansiado Reino de David: um reino com dimensão basicamente social, política e económica; um reino que reivindicasse a autonomia de Israel e entrasse num processo revolucionário contra todo poder estrangeiro (nesse tempo a Palestina estava sob a ocupação romana) e contra toda a imposição que não fosse a exigida nas cláusulas da Aliança.
Está claro que a expectativa dos irmãos tinha um ponto de vista equivocado porque Jesus não pensava num Reino em chave sócio política, nem sócio-revolucionaria. São Tiago teve que abandonar a sua perspetiva e compreender que o projeto de Jesus não era o de triunfar, apenas servir. Por isso, é admirável a capacidade de seguimento destes homens no meio da incompreensão, dos equívocos, das expectativas falhadas e da incómoda postura de estar, continuamente, a descobrir caminhos imprevistos e arriscados, o que os converte em monumentos de fé.
Depois da morte de Jesus, por volta do ano 30, temos pouca informação sobre a vida e atividade de São Tiago. Encontramo-lo expressamente citado nos relatos sobre as experiências de encontro com o Senhor Ressuscitado e, supõe-se, que estaria presente no encontro da Páscoa com os onze, onde se dá a verdadeira mudança de expectativas e de compreensão definitiva do projeto de Jesus.
São Tiago faz parte do primeiro grupo da Igreja de Jerusalém, com os doze e, deduz-se, que deverá ter sido uma figura importante pelo facto de que Agripa I o ter escolhido, com Pedro, como figuras representativas para escarnecer desta primitiva comunidade eclesial.
São Tiago morre decapitado com uma espada por ordem de Herodes Agripa no ano 44 (Act 12, 1-3). Foi o primeiro apóstolo a verter o seu sangue por Jesus. Conta uma lenda, cuja origem vem do tempo de Clemente de Alexandria, que a morte de São Tiago deu-se pela denúncia de um traidor, que ao escutar a firme profissão de fé de São Tiago, se arrepende e é também ele condenado, acompanhando São Tiago a caminho do local do martírio, ao mesmo tempo que lhe pedia perdão.
Jesus tinha dito aos Apóstolos: "Sereis minhas testemunhas, em Jerusalém, em toda a Judeia, em Samaria e até ao fim da Terra (Act. 1, 8). Tinham, pois, que anunciar ao mundo o Evangelho. Onde lhe tocaria ir S. Tiago? Desde a morte de Jesus até à data do seu martírio, passaram-se cerca de 10 ou 12 anos...
Tudo o mais que se conta acerca deste apóstolo pertence ao domínio da lenda. Tradições escritas dos primeiros séculos e narrações orais de muitos lugares da Galiza e Espanha falam das suas pregações. Pode resumir-se assim: Tiago, filho de Zebedeu, depois de pregar na Judeia e na Samaria, encaminhou-se para a Hispânia, evangelizando desde a Andaluzia até à remota e céltica Galiza. As lendas peninsulares acrescentam que o apóstolo, durante a sua estada na Hispânia, foi favorecido com uma aparição da Virgem Maria, então ainda viva, a pedir que lhe edificasse um templo: tal seria a origem do templo do Pilar. Dizem ainda que recrutou aqui alguns discípulos que o acompanharam até Jerusalém. Vendo que pouco aproveitava aqui da sua pregação, voltou para a Judeia onde converteu Fileto, discípulo de um Mago chamado Hermógenes, e por fim também este. Os Judeus, furiosos com estas conversões, dirigiram-se-lhe em tom insultuoso; muitos, porém, vieram a converter-se com a sua pregação e milagres. O sumo-sacerdote Abiatar levou então o povo a apoderar-se do apóstolo e a levá-lo a Herodes Agripa, que lhe mandou cortar a cabeça.
Foi o primeiro mártir de entre os apóstolos. Sucedeu isto em 25 de Março, mas a Igreja fixou-lhe a festa em 25 de julho, data em que seu corpo foi trasladado para a Galiza, segunda a lenda.
O Papa Leão XIII, na Encíclica Deus Omnipotens, publicada em 1884, confirma a autenticidade das relíquias «depois de ter sido morto em Jerusalém, o corpo foi recolhido pelos seus discípulos Atanásio e Teodoro, os quais embarcaram com o Santo Corpo desembarcando nas costas de Espanha, correspondentes a região de Amaia, Finisterra (fim da Terra), onde reinava D. Lupe; esta rainha era idólatra e muito pérfida; no entanto, os discípulos puderam-se livrar das maquinações com que ela os perseguiu à sua chegada e movimentação, e penetrando no interior da região, deram sepultura ao Santo Corpo numa pequena colina, construindo um hipogeu e uma pequena igreja. Os discípulos permaneceram em sua custódia até que, à morte destes, foram enterrados ao lado do apóstolo, pelos naturais do país, que se converteram ao cristianismo.
A lenda conta que, guiados por um anjo, os discípulos navegaram, numa barca de pedra, até à costa da Galiza, Finisterra, subindo depois o rio Ulla até Iria Flavia (hoje, Padron), o porto romano mais importante da zona, para depois enterrar o santo corpo na floresta vizinha, "Liberum Donum", e edificar um altar sobre uma arca de mármore.
Passaram-se séculos, durante os quais - por causa das perseguições e proibição de visitar o lugar, devida sem dúvida, à perseguição dos imperadores romanos contra o cristianismo - o túmulo cai no esquecimento. No início do século VIII, os árabes invadiram a península ibérica, conquistando-a quase toda em nome de Alá e, ameaçando toda a Europa: naquela época pareciam imparáveis. A sua força é unidade. Enquanto isto, os reinos cristãos do Norte da Espanha, ainda não invadidos (protegidos pela natureza hostil do território), pensavam mais em guerrear-se entre eles do que combater de forma organizada o inimigo comum.
No meio desta realidade geopolítica confusa, por volta do ano 813, na remota e esquecida Gaellecia (Galiza), o eremita e pastor Pelayo, começa a ver todas as noites, sobre o monte Librádon, misteriosas luzes sobre um túmulo de um campo (daqui parece derivar o nome de Santiago de Compostela, Campus Stellae). Em sonhos, o Apóstolo S. Tiago aparece-lhe e convida-o a escavar para que o seu sepulcro volte a ver a luz do dia. Pelayo corre a informar Teodomiro, bispo de Iria Flavia, que dá ordem de escavar; durante os trabalhos é encontrada uma arca de mármore dentro da qual se encontram os restos de um homem decapitado. Grita-se: "milagre". E anuncia-se a descoberta do túmulo de S. Tiago. Afonso II, o Casto, rei de Asturias e de Galiza, informa o Papa Leão III, Carlos Magno e outras personagens importantes da época, da descoberta, e faz edificar uma primeira igreja sobre o sepulcro, à volta do qual se desenvolve um pequeno burgo, para o qual transladou a sede episcopal de Iria. É a alvorada de Santiago de Compostela, a terceira cidade santa da cristandade, depois de Jerusalém e de Roma. E inicia-se a peregrinação que de toda a Europa cristã transporta cada vez mais numerosas multidões à tumba do Apóstolo.
Nota: Algumas destas lendas são todas muito tardias: a da pregação na Hispânia não é anterior ao séc. VIII; a da translação para a Galiza desenvolveu-se por fins do primeiro quartel do séc. IX. O culto local do apóstolo, junto do túmulo que lhe foi atribuído, já estava estabelecido no ano de 850. Na antiga liturgia hispânica, a festa celebrava-se a 30 de dezembro.
O Caminho de Santiago começou a ser trilhado pelos primeiros peregrinos cerca de 800 anos depois da sua morte. A história do Caminho é fascinante e, na verdade, teve início quando Teodoro e Atanásio, discípulos de S. Tiago, recuperaram o seu corpo na Palestina e, seguindo a tradição da época de enterrar o apóstolo no local da pregação, transladaram o corpo para o local onde ele havia pregado, numa viagem de sete dias numa barca até ao local do Rio Ulla, em Padron, na Galiza, onde o depositaram para o descanso eterno.
No século VIII, os cristãos da Península Ibérica travavam uma longa luta contra os invasores mouros, que se estendeu de 711 a 1492. A descoberta do corpo do apóstolo na área do conflito foi altamente benéfica para o povo cristão da região, pois além de gerar uma grande curiosidade popular e aumentar o fluxo de fiéis à Península, iniciando um ciclo de peregrinação com o consequente fortalecimento do cristianismo na região, dotou as hostes cristãs de uma figura emblemática, motivo suficiente para unificá-las, tornando-as mais consistentes, mais fortes e, portanto menos vulneráveis diante dos árabes.
Entre os séculos XI e XV, o trânsito intenso de peregrinos transformou Compostela no mais importante centro político e económico do noroeste da Espanha. Contudo, as pestes (séc. XIV) e as guerras religiosas europeias tornaram a caminhada muito perigosa e diminuíram a procura pelo Caminho. Com o encerramento no século XVI da rota francesa como via de peregrinação e comércio, em virtude da guerra entre os reinos de Castela e de França, o Caminho entrou em declínio.
O Caminho tomou novo fôlego a partir do século XX. A multisecular peregrinação a Compostela, pelo Caminho de Santiago, gerou desde o princípio uma prosperidade espiritual, cultural e económica. Fomentou a literatura, a música, a arte e a história e, em consequência, apareceram cidades e vilas, além de inúmeras igrejas, catedrais e hospitais, com o objectivo de apoiar e confortar os peregrinos. O Caminho sempre funcionou como catalisador de culturas, transmissor de ideias e promotor do encontro de povos e línguas, o que foi acentuado fortemente no século XX.
Todos os anos milhares de peregrinos, de entre eles muitas dezenas de escuteiros, fazem os caminhos de Santiago.
Existem inúmeros caminhos, a saber: Caminho Francês; Caminho de Finisterra (Muxia); Caminho do Sudeste (Via de Prata); Caminho Inglês; Caminho do Norte; Caminho Aragonês; Caminho Primitivo; Caminho Português; Caminho de Inverno; Caminho Português pela costa; Rota do Mar de Arousa e o Rio Ulla.
Documentos de apoio:
Scout Yacob